quinta-feira, 28 de abril de 2011

Dubstep Is the New Black

Gênero da música eletrônica surgido na cena underground de Londres no início dos anos 2000, o dubstep caracteriza-se por texturas claustrofóbicas e melancólicas, "de máximo impacto físico e mental", segundo o site Rraurl.com, especializado em música eletrônica. O dubstep começou a se popularizar através de nomes como o de Rusko e se tornou sucesso na cena eletrônica alternativa (não confundir com raves e boates onde predomina o estilo David Guetta) mundial.


Nunca fui em nenhuma dessas festas underground onde rola o dubstep, mas pelo que se vê nas redes sociais, o gênero é constantemente associado a drogas e sexo. Ainda segundo o Rraul.com, ele é essencialmente anti-pop.

Mas, de uns anos pra cá, o dubstep tem aparecido na cena mainstream, o que, é claro, irritou aqueles que já conheciam o estilo "antes de virar modinha". Esse fluxo da cena underground para o mainstream é, muitas vezes, inevitável, principalmente se o objeto em questão tiver qualidade para chamar a atenção de quem atua na indústria pop.

Esse é o caso do dubstep. Desde 2010, há uma verdadeira febre na música pop, com vários remixes aparecendo nas redes sociais da vida. Até mesmo o tema do filme Harry Potter apareceu remixado ao gênero. Embora ele já venha fazendo discretas aparições desde 2007 em músicas de cantoras pop, como Rihanna e Britney Spears, foi só agora que o dubstep foi de fato incorporado ao pop. Femme Fatale, o novo álbum de Spears, lançado em março, é a maior prova dessa integração. A cantora chegou até mesmo a trabalhar com o próprio Rusko (blame it on him). O gênero foi utilizado não apenas no single de abertura do álbum, Hold It Against Me, como também em outras músicas, como na sexy-melancólica Inside Out:


Como não poderia deixar de ser, tudo isso causou polêmica. "Britney matou o dubstep", disseram alguns. Outros reconheceram que a mistura não é das piores, a popularização já vinha acontecendo e em breve entraria de vez na indústria pop. O problema é que, em algumas faixas do álbum, Britney quebra as características de melancolia e claustrofobia do dubstep, misturando o estilo com batidas alegres e melodias grudentas. Essas distorções, porém, sempre acabam acontecendo quando um estilo é popularizado, e seria quase um milagre se o dubstep permanecesse exatamente como foi criado. Apesar disso, em  tempos de pós-modernidade, é aceitável que essa hibridização ocorra, criando ainda mais novos estilos. Tudo o que é bom merece reconhecimento, e, se a indústria pop escolheu o dubstep, todos só tem a ganhar com isso.




Um exemplo puramente dubstep: http://youtu.be/OrsDfQ-qmjs

Quer saber mais sobre música eletrônica? O site http://techno.org/electronic-music-guide/ é um ótimo guia (em inglês) que explica direitinho todos os gêneros e subgêneros, com exemplos pra ouvir.

sábado, 23 de abril de 2011

Rapidinhas sobre os últimos filmes vistos

Testemunha de Acusação (Billy Wilder, 1957): Ah,Wilder... sempre com seus roteiros surpreendentes, com sua direção precisa e uma trama cheia de suspense e reviravoltas. Tipo de filme que você acha que já sabe o final, mas descobre que estava muito enganado. Atuações excelentes de Charles Laughton, Tyrone Power e Marlene Dietrich.

Pickpocket (Robert Bresson, 1959): Inspirado em Crime e Castigo, de Dostoiévski, mas nem por isso deixa de ser um filme autoral. Bresson segue o mote de Crime e Castigo, mas faz questão de explicitar suas diferenças ideológicas, como no tema religião. O filme é drama, mas eu o classificaria como documentário sem hesitar, por seu um retrato angustiante e realista de um batedor de carteiras.  

Netto Perde Sua Alma (Beto Souza e Tabajara Ruas, 2001): Filme da "escola gaúcha", conta a história do general Antônio de Souza Netto, que lutou na Revolução Farroupilha e na Guerra do Paraguai. Apesar de romantizar o personagem-título, o filme procura mostrar os horrores da guerra e retrata a injustiça cometida aos negros (que receberam a promessa da liberdade, não cumprida). Destaque para a fotografia e para algumas cenas teatrais, como a do desfecho do filme.

Quanto Vale ou é por Quilo? (Sergio Bianchi, 2005): Documentário que utiliza o humor ácido para criticar a hipocrisia presente no terceiro setor. Faz pensar sobre as questões sociais do país, tratadas apenas na superfície. Se Bianchi tinha como objetivo constranger os espectadores, tenho certeza que conseguiu. Ótima analogia com a escravidão.

domingo, 17 de abril de 2011

Cordel Encantado


Cordel Encatado estreou na semana passada (Rede Globo, 18:30h) e deu uma mexida nas estruturas da teledramaturgia atual, tanto em termos de linguagem quanto em se tratando de conteúdo. De forma despretensiosa e leve, o enredo fala de dois universos distintos: o sertão nordestino do início do século XX e o reino fictício de Seráfia, com seus príncipes e castelos.

A novela é baseada na literatura de cordel, um tipo de poesia que foi "importada" de Portugal e se tornou popular no nordeste brasileiro. Justamente por isso, as autoras Thelma Guedes e Duca Rachid tem mais liberdade poética para inserir elementos criativos em meio ao contexto histórico. Um exemplo são as interferências modernas no figurino de época (a la Maria Antonieta). Um dos personagens usa óculos azul, por exemplo. O mesmo vale para a direção de arte (meu elemento preferido é o coreto da praça de Brogodó). Todos os elementos técnicos são cuidadosamente pensados. O roteiro também se destaca, como uma espécie de conto de fadas de caráter híbrido, onde várias culturas são mencionadas, até mesmo a árabe.

Outra novidade é que a novela é gravada em película, algo já tentado antes na Globo, mas que teve de ser abandonado no meio. Cordel Encantado utiliza planos abertos e enquadramentos bem interessantes, levando-se em conta as demais novelas do cenário televisivo atual. O núcleo do reino de Seráfia (gravado na França) tem uma fotografia em tons claros e prateados, enquanto o do sertão nordestino é retratado quase sempre em cores quentes, que puxam para o amarelo e para o laranja. 

As atuações não chegam a ser espetaculares, mas são muito boas em geral. Destaco Marcos Caruso e Zezé Polessa, no papel de prefeito e primeira-dama de Brogodó. Os dois fazem a dupla mais engraçada do folhetim, compensando, por exemplo, a atuação forçada e sem graça de Luiz Fernando Guimarães.

Se Cordel Encantado manter a qualidade do roteiro, sem cair em clichês televisivos e estereótipos, e se conseguir manter a linguagem diferenciada até o fim, tem tudo para se tornar uma das melhores novelas que já passaram pelo horário das 18 horas.

segunda-feira, 11 de abril de 2011

Quanto Mais Sangue Melhor II

O Jornal Nacional apresentou, na edição dessa segunda-feira, 11 de abril de 2011, uma reportagem preconceituosa a respeito dos manuscritos achados na casa de Wellington Menezes, responsável pela morte de 12 crianças na semana passada. Os manuscritos fazem referência à religião islâmica e a atentados terroristas, entre outras coisas. 

Assista à reportagem aqui: http://migre.me/4e7Lp

Não é mentira que Wellington tenha citado tanto o islamismo quanto o terrorismo nesses manuscritos, embora tudo indica que ele não estava em perfeita condição de sanidade mental quando o fez. O problema é que essas duas palavras foram usadas quase que como sinônimos pelo repórter Eduardo Tchao, de forma superficial e irresponsável. A reportagem nem ao menos comenta o provável estado de confusão religiosa do assassino, fato que já tinha sido afirmado por especialistas ao canal Globo News.

A reportagem cita ainda o trecho em que Wellington Menezes faz referência ao bullying que sofreu na infância, sem, entretanto, denominá-lo assim. A ligação que está sendo feita pela imprensa, entre o bullying e o massacre da semana passada, foi tida como preconceituosa por pelo menos três especialistas consultados pela Globo News nos últimos dias. Nenhum especialista foi consultado pela Globo sobre esse assunto.

Quanto às questões que o assunto levantaria, pouco ou quase nada foi discutido na tv aberta. Falta de tempo ou de interesse? No agendamento de pautas do horário nobre, é mais lucrativo alertar para um "suposto" terrorista no Brasil do que discutir questões como o contrabando de armas e as doenças psicóticas, só para dizer algumas. 

Aliás, segundo o responsável pelo inquérito, em entrevista (novamente) à Globo News, é pouco provável que a ligação entre Wellington Menezes e o terrorismo tenham algo a ver com o massacre. A Globo omitiu a verdade, preferindo, mais uma vez, o espetáculo.

sexta-feira, 8 de abril de 2011

Quanto Mais Sangue Melhor

Não foi nenhuma surpresa ver a tragédia que deixou 12 crianças mortas na escola Tasso da Silveira virar espetáculo na televisão brasileira. Emissoras brigavam pela "melhor imagem", aquela que chegasse o mais próximo possível do momento exato do massacre. Quanto mais sangue, melhor.

A Band começou sua edição do Jornal da Band com um vídeo que sintetizava os piores momentos da tragédia. Com uma música dramática ao fundo e uma edição de vídeo acelerada, o que se via eram crianças correndo ensanguentadas ou então as palavras "sangue, sangue, crianças mortas". Nas reportagens, espaço para a reconstrução do fato, para o desespero dos pais, para a retrospectiva de fatos parecidos ao redor do mundo (com direito às "melhores imagens") e, principalmente, para exibição de vídeos amadores. A emissora não se dedicou a levantar maiores questionamentos; ao invés disso, dedicou 1 minuto para a repercussão internacional do fato. Assim, também, foi a repercussão nas redes Record e Globo.

A Record fez uma cobertura ainda mais sensacionalista do fato, mostrando imagens dos feridos sem nenhum pudor, inclusive do buraco que uma das balas teria feito em uma vítima. Vídeos amadores mostravam os pais correndo pelos corredores enquanto uma criança ferida permanecia no chão. A emissora deu destaque para a reconstrução do fato, para a reação dos pais, para o policial que matou o assassino, para um breve perfil do assassino, que foi representado como uma pessoa anti-social e isolada, e para a reação da presidente Dilma Rousseff, que fez questão de mostrar o quão comovida ficou a presidente.

A comoção de Dilma também foi mostrada pela Globo, além de reportagens com entrevistas com os pais e pessoas que ajudaram e com a reconstrução do fato. O principal trunfo, porém, foi o relato da estudante Jade, que narrou de forma emocionante os momentos de pânico e, no fim, agradeceu ao policial que matou o assassino. Márcio Alexandre Alves foi um dos destaques da edição, retratado como verdadeiro herói. A Globo dedicou ainda uma reportagem ao perfil do assassino, com entrevistas exclusivas concedidas pelos vizinhos e pelo irmão adotivo dele, que destacou que a mãe biológica do rapaz também tinha um histórico de doença mental e, ainda, contou que o irmão admirava o atentado terrorista de 2001. Ao mostrar a carta deixada por ele, o fanatismo religioso foi mostrado como destaque. O bullying também foi uma das questões citadas como relação a esse tipo de tragédia, embora nenhuma fonte tenha sido usada para legitimar essa ligação. 

Em suma, o que se viu foram informações não-verificadas, muitas imagens chocantes de vídeos amadores e, especialmente, sonoras emocionantes dos entrevistados, que utilizaram dezenas de vezes a palavra "sangue". É a tragédia em forma de espetáculo televisivo. 

Até agora, houve pouco espaço para debate, a não ser alguns questionamentos sobre o desarmamento (na Globo, o comentarista de segurança Rodrigo Pimentel afirmou que a única medida capaz de evitar esse tipo de tragédia seria a proibição do uso de armas. Não foi dado espaço para uma opinião divergente). O assunto ainda vai durar pelo menos uma semana. Depois do primeiro dia, pautas serão puxadas do fato inicial e renderão até que a próxima tragédia ocorra. É nesse espaço de tempo que veremos quais questões serão postas em debate pela mídia e de que forma elas serão tratadas. Postarei de novo sobre isso na semana que vem.